Pedagoga fala sobre os medos dos pais na hora de deixar os filhos na escola pela primeira vez
O ano letivo da rede pública estadual iniciou nesta semana para alunos da educação infantil, ensino fundamental e médio. As escolas e CEIMs do município de Criciúma, retomam suas atividades, somente na próxima segunda-feira(14). Um misto de emoções vem tomando conta de muitos pais da educação infantil, não só porque estamos na pandemia ainda, mas pelo fato que é hora de “desapegar” de seus pequenos e deixá-los ir em direção ao universo da ludicidade e da socialização. Mas, de que forma os pais podem cooperar com a adaptação dos filhos, principalmente para aqueles que estão indo para a educação infantil pela primeira vez?
A pedagoga Eliane Albino de Souza, graduada em Pedagogia, pós graduada em Psicopedagogia (Clínica e Institucional) e especializada em AEE (Atendimento Educacional Especializado), atua como professora a mais de vinte anos, principalmente com crianças de até quatro anos de idade. Eliane ressalta sobre a importância dos pais conhecerem a instituição de ensino, e também gerar na criança curiosidades sobre as vivências que terão nessa nova fase da vida. “Os pais devem estimular a curiosidade da criança, relatando a elas aventuras e descobertas que essa nova fase trará. Esse estímulo será fundamental no processo de adaptação e aceitação da criança com o seu novo mundo”, comenta a pedagoga.
Outra questão fundamental observada por ela é que os pais precisam ter um bom relacionamento com o corpo pedagógico da instituição, pois a segurança expressa pelo pais com relação aos novos tutores dos filhos, vai influenciar diretamente na forma da criança se relacionar naquele ambiente. “ Havendo um relacionamento hostil e autoritário por parte dos pais, a criança logo se sentirá à vontade para fazer birras e reinas impondo sua vontade, tal o exemplo dos pais; se o pais foram inseguros em demasia, a criança terá comportamentos de choro constante no momento em que os pais se afastarem dela e a deixarem com pessoas com as quais ela não tinha convivido ainda isso causará um sentimento de abandono, mas no momento que o pais tratarem com cordialidade a professora e demais colaboradores da instituição, expressarem um diálogo amistoso e gentil, a criança logo vai perceber que aquele ambiente ela será acolhida e não terá motivos nenhum para se assustar”, esclarece.
A vendedora de móveis Laura da Silva, é mãe da Vitoria, que completa dois anos, em maio. Ela voltou a trabalhar fora somente esse ano. A menina nasceu no ano da pandemia, e acabou ficando mais isolada de parentes e do convívio de colegas da mesma idade. Somente depois que os pais se vacinaram contra a Covid-19, é que eles passaram a permitir que a menina recebesse visitas em casa e fosse para espaços coletivos onde tinham outras crianças. Esse será o primeiro ano de Laura na escolinha, e a mãe relata que sua angústia em desapegar da filha vem aumentando a cada dia. “Já comprei os materiais e uniformes, está tudo muito organizado. A professora dela é uma conhecida aqui mesmo do bairro, mas só de pensar que vou passar o dia inteiro longe dela, chego a passar mal. Me sinto aflita, pois não sei como ela vai reagir longe da gente, não estou preparada pra ver ela chorando”, relata a mãe.
O fato de estranhar um ambiente diferente, é um processo que todos nós passamos quando migramos para algo novo, seja o emprego, uma nova cidade, um novo curso. A mudança passa a agir em nós, e algumas sensações físicas são sentidas: mãos suadas, pernas balançando. No caso das crianças, o choro faz expressar o medo, a negação, e a saudade que tem de casa. “É muito normal haver o choro no momento que os pais deixam os filhos e se “despedem”, mas isso não pode ser feita de forma penosa ou dolorosa. Horas depois vai haver o reencontro, e com muita novidade para compartilhar”, frisa a pedagoga.
Helena Vieira é mãe de Samuel que ainda não completou um ano. Ela trabalha em uma fábrica de alimentos com o marido, e apos longa conversa com o esposo decidiram colocar o bebê na educação infantil. Ela criou uma rede de apoio com outras mães, e fica comparando experiências pra tentar se consolar, sobre tudo o que pode ou não acontecer. “Eu sei que vai ser importante pra ele, mas ele é tão pequeno, tem horas que penso em desistir, o meu marido tem hora que deixa e tem hora que não quer levar mais. Até que aula comece não sei exatamente o que vamos fazer. Não me sinto preparada pra ficar longe do meu bebê mesmo que seja apenas por uma manhã ou uma tarde”, desabafa ela.
Mas, o que realmente é MITO e o que é VERDADE quando se fala em adaptação na educação infantil?
A Pedagoga Eliane traz algumas definições:
Mito – criança que já frequenta a escolinha não precisa de adaptação. Precisa sim, pois será um novo ano, uma turma nova, colegas novos, uma nova professora. Ela não vai agir da mesma forma que no ano passado. Se nós adultos já mudamos, imagina os pequenos.
Verdade – Quando os pais se dispõe a obedecer o regimento da instituição e a prezar pelo bom convívio com os colaboradores e as outras crianças, isso promove o fortalecimento de vínculos de amizade e respeito, por que o exemplo está vindo dos pais, e isso traz segurança para as crianças.
Mito – Professor não pode dar colo” de mais e nem mimar aluno senão vai ficar manhoso. O professor deve acolher e acalentar e tudo isso deve ser feito com moderação, lembrando de dar atenção a todas as crianças. Ações afetuosas encorajam a criança, e estreitam laços naquele espaço que ela vai passar a frequentar. Em casa geralmente há um colo à disposição da criança, cada vez que ela se sente insegura ou tem medo de alguma coisa.
Verdade – Professor também passa por processo de adaptação com a turma. Tem que estar planejado, e ter uma programação interativa para entusiasmar e envolver as crianças naquele ambiente, brincadeiras em grupo, fantoches, contação de história, e música por exemplo.
Mito– Criança que não chora no primeiro dia e na primeira semana está tudo bem, não vai chorar mais. Na verdade, não houve choro por causa da euforia, da novidade. Mas pode haver momentos em que dará saudade de casa, ou até mesmo dificuldade em ter que seguir uma rotina que antes na casa dela não havia.
Segundo psicóloga, apoio dos pais é fundamental na adaptação dos filhos
Para a psicóloga Daiane Monteiro, a maioria das mães, o momento de voltar a trabalhar e colocar seus filhos pequenos na escolinha é desafiador porque vem acompanhado pelo sentimento de culpa.
“Culpa essa que afeta a sua autoestima, o seu próprio valor. Outro ponto é pensar que não está correspondendo às expectativas sociais e familiares. As expectativas sociais e familiares são muito pesadas, pois fomos ensinados que as mães vêm com selo de qualidade, e isso é muito cruel. A culpa pode ser gerada pelo fato de terem que trabalhar em função da dificuldade financeira, achando que se tivessem disponíveis 24 horas para os filhos poderiam cuidar deles pessoalmente e assim não precisam frequentar a escolinha tão cedo”, explica Daiane.
Mas, sabemos que o trabalho não tem apenas uma função econômica, ele também é fonte de satisfação pessoal para a mulher, em que ela pode se sentir realizada. Ela ainda destaca que a participação e o apoio dos pais é fundamental nesse momento de vida dos pequenos, bem como a mãe não precisa se sentir sobrecarregada, pois a responsabilidade não é somente dela.
Bárbara Almeida é a mãe de Rafael Almeida, que hoje tem cinco anos. No seu primeiro ano na educação infantil, quando tinha apenas três anos, a mãe levou o menino até a creche, foi recebida pela professora que abraçou o menino, e ele logo correu para o fundo da sala para mexer nos brinquedos.
“Fiquei ali na porta olhando pra professora e pro meu filho que estava rindo e brincando com todo mundo, ele nem olhava pra mim, nem me deu tchau, e a professora só dizia, pode ir mãe que vai ficar tudo bem. Eu não queria que o meu filho reagisse assim, eu queria que ele sentisse a minha falta”, relembra a mãe.
Conforme a psicóloga, a vida escolar tem aspectos importantes para a criança, como por exemplo, o desenvolvimento de habilidades sociais como a socialização, a comunicação, rotina, regras sociais, alimentação, higiene básica, dentre outras.
“É natural a mãe se questionar sobre a criação dos filhos, sem saber se está ou não educando da melhor forma, a maioria se sente assim. Mas a verdade é que ninguém consegue ter certeza se está fazendo a coisa “certa”. Não existe uma fórmula, uma receita de bolo. E tem mais, o desenvolvimento dos pequenos não depende apenas da mãe, ela não é a única influência na vida do filho”, complementa Daiane.
Um ponto importante para que os pais possam minimizar a frustração, é conhecer a escolinha, estar sempre atenta às mudanças emocionais e comportamentais da criança e, caso tenha dúvida, pode procurar atendimento profissional, com pediatra, psicopedagogo e psicólogo infantil.